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quinta-feira, 21 de agosto de 2014

Hans Staden um aventureiro alemão (cronista ao mesmo tempo que turista)

" VIAGEM AO BRASIL "

Hans Staden


1. Foi Hans Staden um aventureiro alemão, de Homberg, Hesse, cronista ao mesmo tempo que turista. Numa primeira viagem ao Brasil houvera estado em Pernambuco. Na segunda embarcou em Sevilha na expedição espanhola de Diego Sanábria, novo Governador designado do Paraguai
Dividida a expedição em duas secções, antecipou-se a primeira, na qual veio Hans Staden, sobre a vinda do Governador. Era um galeão com três bergantins, levando 200 pessoas sob o comando de Johan de Salazar y Spinoza. Aportava na Baia Sul da Ilha de Santa Catarina em 25 de novembro de 1549.


" Como chegássemos ao grau 28 disse o capitão ao piloto que entrasse por detrás de uma ilha e deitasse âncora, a fim de ver em que terra estávamos. Entramos, então, entre duas terras, onde havia um porto excelente, deixamos a âncora ir ao fundo e deliberamos.

Cap. 9. De como alguns dos nossos saíram no bote para reconhecer o porto e acharam um crucifixo sobre uma rocha.
Foi no dia de Santa Catarina, no ano de 1549, que deitamos âncora, e, no mesmo dia, alguns dos nossos, bem municiados, saíram no bote para explorar a baía. Começamos a pensar que fosse um rio, que chamam rio de são Francisco, situado também na mesma província, pois que, quanto mais entrávamos mais comprido parecia.
Olhávamos de vez em quando, a ver se descobríamos alguma fumaça, porém nada vimos. Finalmente, pareceu-nos ver umas cabanas e para lá nos dirigimos.


Eram já velhas, sem pessoa alguma dentro, pelo que continuamos até de tarde. Então vimos uma ilha pequena na frente, para a qual nos dirigimos, a passar a noite, julgando haver ali um abrigo.
Chegamos à ilha, já noite; não podíamos, porém, arriscar-nos a irmos à terra, pelo que alguns dos nossos foram rodeá-la a ver se por ali havia gente; mas não descobriram ninguém. Fizemos, então, fogo e cortamos uma palmeira, para comer o palmito, e ficamos ali durante a noite.
De manhã cedo, avançamos pela terra a dentro. Nossa opinião era que havia ali gente, porque as cabanas eram disto um indicio.
Adiantando-nos, vimos ao longe, uma rocha, uma madeira, que nos pareceu uma cruz e não compreendíamos quem a teria posto ali. Chegamos a ela e achamos uma grande cruz de madeira, apoiada com pedras e com um pedaço de fundo de barril amarrado e, neste fundo, gravadas umas letras que não podíamos ler, nem adivinhar qual o navio que teria erigido esta cruz; e não sabíamos se este era o porto onde devíamos nos reunir.


Continuamos então rio-acima e levamos o fundo do barril. Durante a viagem, um dos nossos examinou de novo a inscrição e começou a compreendê-la. Estava ali gravado em língua espanhola:

 SI VEHN POR VENTURA, ECKY LA ARMADA DE SUA MAJESTAT, TIREN, UHN TIRE AY AUERAN RECADO (se viene por ventura aqui la armada de su magestad, tiren um tiro y haran recado).

Isto quer dizer: se por acaso vierem navios de sua majestade dêem um tiro e terão resposta.
Voltamos, então, sem demora para a cruz e disparamos um tiro de peça, continuando depois, rio-acima, a nossa viagem.
Pouco depois, vimos cinco canoas com selvagens, que vieram sobre nós, pelo que aprontamos as nossas. Chegando mais perto, vimos um homem vestido e barbado que vinha à proa de uma das canoas e nos parecia cristão. Gritamos-lhe para fazer alto às outras canoas e vir com uma só a conversar conosco.
Quando se aproximou perguntamos-lhe em que terra estávamos; ao que nos respondeu que estávamos no porto de Schirmirein, assim denominado pelos selvagens, e para melhor o entendermos, acrescentou chamar-se Santa Catarina, nome dado pelos descobridores.


Alegrou-nos muito isto, porque este era o porto que procurávamos, sem conhecer que já nele estávamos, coincidindo ser isso no mesmo dia de Santa Catarina. vede, pois, como Deus socorre àquele que no perigo o implora com fervor.
Então nos perguntou ele de onde vínhamos, ao que respondemos que pertencíamos a armada do Rei da Espanha, em caminho para o rio de La Plata, e que havia mais navios em viagem, que esperávamos, com Deus, chegassem logo para nos unirmos a eles.
A isto responde ele que estimava muito e agradecia a Deus, porque havia três anos que tinha saído da província do rio La Plata, da cidade chamada La Soncion, pertencente aos espanhóis, por ter sido mandado à costa, cidade distante 300 milhas do lugar onde estávamos, para fazer com os Carijós, que eram amigos dos espanhóis, plantassem raízes que se chamam mandioca e suprissem as naus que disso precisassem. Eram essas as ordens do capitão que levara as últimas novas a Espanha e se chamava Salaser e que agora voltava com outras naus.
Acompanhados então dos selvagens até as cabanas onde ele morava, ali fomos bem tratados.


Cap. 10. Como me mandaram a nossa nau grande numa canoa cheia de selvagens.
Pediu então o nosso capitão ao homem, que achamos entre os selvagens, que mandasse vir uma canoa, com gente que levasse um de nós a nau, para que esta também pudesse vir.
Ordenou-me que seguisse com os selvagens até a nau, ausentes dela como estávamos já três noites, sem que a gente de bordo soubesse que fim tínhamos levado.
Quando cheguei à distância de um tiro da nau, fez-se lá um grande alarido, pondo-se em guarda a maruja e não consentindo que mais perto chegássemos com a canoa. Gritaram-me, indagando do que havia acontecido, onde ficaram os outros e como é que vinha eu sozinho naquela canoa cheia de selvagens.
Calei-me ; não respondi, porque o capitão me ordenara que fingisse estar triste e observasse o que se fazia a bordo.
Como lhes respondi, diziam lá entre si: aqui há coisa; os outros, de certo, estão mortos e estes agora vêm com aquele só, para armar-nos uma cilada e tomar o navio. Queriam, então, atirar contra nós, porém, chamaram-me ainda uma vez.
Comecei então a me rir e lhes disse que ficassem tranquilos, pois que lhes trazia boas novas, e com isso permitiram que me aproximasse. Contei então o que me tinha passado, o que muito os alegrou, e os selvagens voltaram sozinhos.
Seguimos logo com a nau até perto das cabanas, onde fundeamos, à espera das outras naus, que se tinham desgarrado por efeito da tempestade.
A aldeia onde moravam os selvagens chama-se Acutia e o homem que lá achamos chama-se João Femandez Biscainho, da cidade de Bilbáo. Os selvagens eram caiós e trouxeram-nos muita caça e peixe, dando-lhes nós anzóis em troca.


Cap. 11. Como chegou a outra nau da nossa campanha, que se tinha desgarrado e onde vinha o primeiro piloto.

Com cerca de três semanas de espera, chegou-nos a nau em que vinha o primeiro piloto; mas a terceira nau era perdida de todo e nada mais soubemos dela.
Aparelhamos, então, para sair e fizemos provisão para seis meses, pois havia ainda cerca de 300 léguas de viagem por mar. Quando tudo estava prestes, aconteceu-nos perder a nau grande no porto, o que impediu a nossa partida.
Ficamos aí dois anos no meio de grandes perigos e sofrendo fome. Tínhamos que comer lagartos, ratos do campo e outros animais esquisitos, que lográvamos colher, assim como mariscos que vivem nas pedras e muitos bichos estravagantes.
Os selvagens que nos davam mantimentos, só o fizeram enquanto recebiam presentes de nossa parte; fugiram depois para outros lugares e como não podíamos fiarnos neles, dissuadimo-nos de aí continuar com perigo de perecer.
Deliberamos, pois, que a maior parte dos nossos devia ir por terra para a província de Sumption, daí distante cerca de 300 milhas. Os outros iriam no navio que restava. O capitão conservava alguns de nós que iriam por água com ele. Os que iam por terra levavam, alguns mantimentos e alguns selvagens. Muitos deles, é certo, morreram de fome no sertão; mas os outros chegaram ao seu destino como depois soubemos; entretanto, para o resto dos nossos homens o navio era pequeno para navegar no mar.

Cap. 12. Como deliberamos ir a São Vicente, que era dos portugueses, a arranjar com eles um navio para fretar, e terminar assim a nossa viagem; porém, naufragamos e não sabíamos a que distância estávamos de São Vicente.
Os portugueses têm perto da terra firme uma ilha denominada São Vicente. Esta ilha se acha há cerca de 70 milhas do lugar onde estávamos. Era nossa intenção irmos até lá, a vermos se possível era havermos dos portugueses um barco de frete e seguirmos até o rio de La Plata, pois o que tínhamos era pequeno demais para nós todos. A este fim, alguns de nós partiram com o capitão Salazar para a ilha de São Vicente; mas nenhum de nós tinha lá estado, exceto um de nome Ramon, que se obrigou a mostrar a ilha.
Saímos, pois, do forte de Inbiassape (Sul da Ilha de SC) que se acha no grau 28 ao sul do Equinóxio, e chegamos cerca de dois dias depois da nossa partida a uma ilha chamada Alkatrases, mais ou menos a 40 milhas do lugar de onde saimos. "




http://www.cfh.ufsc.br/~simpozio/portugue.html

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